Dois amigos engenheiros resolvem migrar de área e fundam uma startup de marketing que, prestes a completar cinco anos, tem hoje 50 funcionários e espera faturar R$ 25 milhões em 2019, três vezes mais do que no ano passado. Parece improvável, mas é essa a trajetória de Felipe Oliva, 28, e Carlos Tristan, 30, sócios da Squid, que conecta grandes marcas a microinfluenciadores digitais.
Hoje, a startup tem cerca de 14 mil influenciadores em sua base e já soma em seu portfólio aproximadamente 1,5 mil campanhas para mais de 400 anunciantes ou parceiros. Entre os clientes, estão companhias como Natura, Magazine Luiza, Pandora, Bradesco e 99.
Microinfluenciadores, para a Squid, são usuários de redes sociais com perfis que tenham entre 5 mil e 100 mil seguidores. A percepção de que o conteúdo gerado por essas pessoas é mais “real” e engajador explica o porquê de marcas gigantes buscarem essa conexão.
Um exemplo foi a campanha desenvolvida pela Squid para a Omo, da Unilever. A descrição das cenas de um roteiro de vídeo foi enviada para a base de microinfluenciadores da Squid. Era preciso colher imagens de gente brincando na lama e famílias interagindo em uma lavanderia, por exemplo. O resultado está no canal da Omo no YouTube. Nas palavras de Carlos:
“A gente foge da postagem básica dos influenciadores. É uma capacidade de gerar conteúdo autêntico”
Em outro projeto, em maio deste ano, a Squid criou e executou uma campanha de C&A para o Dia das Mães em que ativou mais de 100 influenciadores no Brasil. O objetivo da ação era contemplar a diversidade das famílias brasileiras, a partir de histórias reais de influenciadores que representassem os consumidores da marca. Foram mais de 12 milhões de impressões e 9 milhões de pessoas alcançadas.
UMA CAMPANHA DE UMA MARCA DE LUXO BRITÂNICA INSPIROU O NEGÓCIO
Formado em engenharia civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), Carlos pisou, profissionalmente, num canteiro de obras só quando estágio na Gafisa, entre 2011 e 2012. Não era a dele. Ao estagiar na consultoria Lunica, abriu os olhos para o universo das startups. “Trabalhei no projeto da TruckPad, um aplicativo que conecta caminhoneiros a cargas e estava nascendo. Gostei daquele ambiente.”
Em paralelo, Felipe Oliva, seu amigo e colega na Poli, traçava sua própria trajetória, passando por startups como Restaurama (uma empresa de agendamento de reservas em restaurantes que não existe mais) e EvoBooks, que integra tecnologia à sala de aula.
Admiradores do ambiente empreendedor, os dois tiveram a ideia de criar a Squid em 2014, quando conheceram uma campanha da marca de luxo britânica Burberry, feita anos antes. A marca criara sua própria plataforma de mídia social (The Art of Trench) e deixou que os consumidores alimentassem o site com conteúdo gerado por eles mesmos. Carlos conta:
“Em 2009, eles usaram fotos dos consumidores vestindo peças da marca e isso viralizou. Ninguém fazia isso. Essa forma autêntica de comunicação chamou a nossa atenção”
A ideia dos dois engenheiros era criar um aplicativo e oferecê-lo para as marcas, seguindo a linha do que a Burberry havia feito. “Só que a gente não tinha dinheiro”, lembra Carlos. O que eles fizeram, então, foi escrever um projeto para submetê-lo ao Startup Brasil, programa de aceleração de startups do governo federal. Foram selecionados e, além da mentoria, receberam um aporte de R$ 225 mil.
“Como a gente trabalhava no mesmo prédio, mas em empresas diferentes, depois que o pessoal da consultoria ia embora, à noite, o Felipe descia e a gente trabalhava no plano de negócios”, diz. Naquela época não havia ainda a figura do influenciador digital. A Squid nasceu, então, para conectar marcas e fãs.
UM APORTE DEU FÔLEGO PARA OS JOVENS DEIXAREM O EMPREGO
Com o dinheiro que receberam do Startup Brasil, em 2014, pediram demissão para se dedicar ao aplicativo, trabalhando na casa dos pais do Carlos ou na Starbucks mais próxima. “A gente não tinha dinheiro para pagar o aluguel de um escritório.”
Como os dois nada sabiam de programação, focaram seus esforços no comercial, enquanto o desenvolvimento do app ficou com Felipe Lima, 27, dono de uma pequena empresa de desenvolvimento de software em Penha, Santa Catarina, onde morava — hoje, ele é CTO (chief technology officer) e sócio da Squid.
“Eu e o Felipe [Oliva] ligávamos para as agências e para os sites de e-commerce para explicar o que estávamos fazendo”, diz Carlos. Em pouco tempo fecharam os dois primeiros contratos, que geraram uma receita de R$ 40 mil em 2015.
No começo, as campanhas aconteciam dentro do aplicativo criado pela Squid: “Era um app que ganhava a cara da empresa que nos contratava, para a marca criar sua própria comunidade”, diz Carlos. “Mas isso não estava avançando”.
Então, o modelo foi ampliado para que os usuários também pudessem publicar seus conteúdos nas redes sociais que as marcas já usavam. A tecnologia passou a permitir o monitoramento do que acontecia nas redes sociais e a inclusão das fotos publicadas pelos consumidores no site de comércio eletrônico da empresa, logo abaixo das “fotos oficiais” da marca — assim, o consumidor podia ver outros clientes usando o produto.
CULTURA ORGANIZACIONAL: MOTIVAÇÃO PARA EMPREENDER
Com a empresa crescendo, veio o primeiro escritório, em um coworking. Foi quando Felipe Lima se mudou para São Paulo. “A gente entendeu que, para ter uma cultura forte de empresa, precisava ter todo mundo junto fisicamente”, diz Carlos. Essa questão da cultura organizacional foi em parte o que motivou os dois sócios-fundadores a empreender.
“Eu via as pessoas reclamando de seus empregos e pensava: ‘por que não pode haver um ambiente de trabalho legal, descontraído e que gere resultado?’ Meu foco era desenvolver essa cultura.”
O escritório atual da Squid, em Pinheiros, São Paulo, é de fato bem descontraído. Todos trabalham lado a lado — as salas existem apenas reuniões. Funcionários fazem seu próprio horário, não precisam seguir um “dress code” e podem optar pelo home office. O importante é ser produtivo e entregar o que é pedido.
A startup começou a receber demandas das agências de publicidade para identificar microinfluenciadores digitais. “Como a gente já monitorava as hashtags, fizemos um corte, levantamos quem tinha a partir de 5 mil seguidores, e passamos a entregar listas de influenciadores para as agências”, diz Carlos.
“Nessa época já existia a figura do influenciador digital, mas não havia uma metodologia para trabalhar com esse perfil. É algo muito mais trabalhoso, porque é preciso falar com muitas pessoas. Nossa tecnologia automatiza todo esse processo”
A plataforma foi aperfeiçoada para fazer o recrutamento de microinfluenciadores digitais, além de monitorar o conteúdo gerado e o impacto causado.
CERCAR-SE DE PESSOAS QUE SABEM MAIS FOI FUNDAMENTAL
Desde 2016, a Squid vem incorporando novos sócios. Um deles é Fausto Matsuda, 29, que tinha seu próprio negócio e havia desenvolvido uma tecnologia que permitia mensurar as vendas que cada usuário gerava para as marcas. Outro que se juntou à empresa foi Ronaldo Melo, 41, head da área comercial.
“O Ronaldo entendia do mercado de influenciadores, nos ajudou na precificação do serviço e no contato com as agências. Em 2017, com a entrada dele, a Squid aumentou seu faturamento em dez vezes”, diz Carlos.
No fim daquele ano, a empresa já tinha ao todo 35 pessoas (um investimento-anjo de R$ 400 mil ajudara a alavancar contratações). E, em 2018, a sexta sócia se integrou ao negócio: Isabela Ventura, 35, que assumiu a cadeira de CEO em abril daquele ano. Com a chegada dela, Felipe Oliva deixou a cadeira de CEO e assumiu como CSO (chief strategy officer, ou líder de estratégia). Carlos explica a mudança:
“A gente precisava de alguém com capacidade de liderança mais forte, que entendesse do mercado. Alguém melhor que a gente”
Até então, Isabela era diretora geral da Lomadee, uma empresa do grupo Buscapé Company, onde já estava há sete anos, e pretendia fazer uma mudança de carreira. Quando veio o convite para assumir como CEO, foi uma surpresa.
“Ficamos ‘namorando’ um tempo, saíamos para tomar café, foram muitas conversas, para eu entender os valores da empresa, saber se estavam alinhados com os meus”, diz Isabela. “Percebi que a minha voz estava sendo ouvida, e achei que eu conseguiria levar um olhar diferente de liderança”.
A humildade de saber que não conhecem tudo e se cercar de pessoas qualificadas ajudou os dois sócios-fundadores a alavancar o negócio. Com a chegada de Isabela, a Squid reposicionou a marca, mudou o logotipo e ressignificou sua missão. É a própria CEO quem define:
“Não somos somente uma plataforma que conecta microinfluenciadores a marcas. Temos a missão de descentralizar a comunicação. Os microinfluenciadores democratizam a comunicação, damos voz às pessoas.”
Izadora Barros aprendeu a conectar pessoas em torno de uma marca ao criar o fã-clube do RBD no Orkut. Hoje, à frente da Commu, ela fatura ajudando empresas (como a Unilever) e influenciadores a gerenciar suas comunidades.
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