Você já perdeu uma noite de sono se revirando na cama? Então sabe quão aflitivo é querer dormir e não conseguir. Agora, imagine passar por essa “tortura” todos os dias.
Não é pouca gente que vive isso. Cerca de 45% dos brasileiros têm problemas na hora do encontro com o travesseiro, segundo levantamento de 2019 da Associação Brasileira do Sono.
Uma alternativa muito buscada e inclusive recomendada por médicos para contornar esta situação é recorrer a remédios. Mas será mesmo necessário aderir a pílulas, muitas vezes de tarja preta? Os fundadores da Vigilantes do Sono acreditam que, na maioria dos casos, a resposta é: não. Segundo Lucas Baraças, 31, CEO da startup:
“Os remédios são uma solução, mas acabam se tornando grandes vilões por conta da dependência”
Em vez dos comprimidos, a Vigilantes aposta num programa digital baseado na Terapia Cognitivo-Comportamental para a Insônia (TCC-I).
Na prática, para dormir melhor, o insone vai seguir as orientações de uma inteligência artificial da startup, a Sonia. Ela não vai te mandar contar carneirinhos nem cantar uma canção de ninar, mas ajudará a mudar hábitos e comportamentos, incentivando o usuário a adotar horários fixos para dormir e levantar, a abandonar o uso do celular na cama, a preencher um diário do sono etc.
São medidas simples, mas que podem reduzir o tempo que a pessoa demora para adormecer em até 45 minutos e a dormir até 60 minutos a mais por dia, segundo métricas da startup. E os empreendedores garantem: a longo prazo, o tratamento digital traz resultados melhores do que os remédios como solução definitiva para a insônia.
Colegas da época em que estudavam engenharia na Poli-USP, Lucas Baraças e Guilherme Hashioka, 31, tiveram contato com a questão da insônia quando atuavam na Taqtile, negócio que desenvolve soluções digitais para empresas (e que futuramente viria a investir na startup dos dois ex-colaboradores).
“Eu nem sabia que isso era um problema. Achava que não conhecia ninguém que dormia mal”, diz Lucas. Mas meu pai tinha dificuldades, amigos meus tomavam remédio e eu nem sabia.”
A questão é que, ao contrário por exemplo do excesso de peso, os efeitos da insônia não são facilmente perceptíveis por outras pessoas que não sofrem dela.
“A insônia é uma condição extremamente solitária, ninguém fala muito a respeito, muitas vezes nem com a pessoa que está ao seu lado da cama, porque ela está dormindo enquanto você está acordado”
Os engenheiros fizeram uma imersão no tema em 2014, quando realizaram uma consultoria para um dos clientes da Taqtile, uma farmacêutica que vendia remédios para dormir, e desenvolveram para a empresa um projeto de tratamento da insônia por meio de uma abordagem comportamental.
Apesar do feedback positivo, contam, o cliente acabou não levando a proposta adiante. E mesmo se tratando de um mercado potencialmente grande, a dupla deixou a ideia quieta — adormecida — por um tempo.
Lucas acabou saindo da empresa e se mudando para Barcelona; Guilherme foi tocar outros projetos… Até que, no fim de 2018, a ideia ressurgiu nas conversas entre os dois, com a possibilidade de se tornar mais do que um sonho.
Em janeiro de 2019, já com Lucas de volta ao Brasil, os amigos começaram a estruturar melhor o que seria a Vigilantes do Sono. Como os dois não tinham conhecimento técnico sobre o tema, começaram a estudar.
“Acho que nos primeiros três meses de empresa, eu li mais artigos científicos do que nos dois anos e meio de mestrado”, conta Lucas.
Apesar do esforço de se inteirar do assunto, eles estavam cientes de que precisavam de um especialista e, por indicação, chegaram à psicóloga Laura Castro, 40, que atuou por mais de quatro anos no Instituto do Sono.
“Ela estava prestes a embarcar para fazer parte do seu doutorado em Harvard, e ficou muito reticente com a ideia por não saber se ia funcionar, mas acabou topando entrar como fundadora.”
Já existiam aplicativos internacionais com a proposta de oferecer um programa digital de Terapia Cognitiva Comportamental para a Insônia. Entre eles, o Sleep, nos Estados Unidos, e o Sleep Station, na Inglaterra.
“Para validar de forma rápida se a nossa abordagem funcionaria, decidimos começar nosso MVP, em janeiro de 2020, com um chatbot dentro do Messenger [ferramenta de mensageria do Facebook]. Tudo de forma gratuita, levando em conta que estávamos em um momento de pandemia e várias pessoas estavam dormindo mal”, diz Lucas.
Nos primeiros três meses, com divulgação nas redes sociais, a Vigilantes do Sono rapidamente alcançou um público expressivo:
“A gente anunciava: ‘Tratamento grátis para a insônia. Clique aqui’ e assim choveu gente interessada. Conquistamos 18 mil usuários”
Apenas em abril deste ano, com o investimento de 1,1 milhão de reais da Taqtile, os sócios migaram a plataforma do modelo web para um aplicativo.
Depois de meses de testes, os sócios chegaram a alguns modelos de obtenção de renda, em agosto do ano passado. No B2C, o usuário paga 200 reais, apenas uma vez, para ter acesso à ferramenta por 12 meses. “No geral, para quem é engajado, realiza as atividade diárias, consegue terminar as 45 sessões em dois meses”, afirma o empreendedor.
A Vigilantes do Sono também vende o serviço para médicos, que podem optar por pagar uma assinatura para fornecer gratuitamente o acesso à plataforma aos seus pacientes ou apenas indicar o programa da Vigilantes para um tratamento com acompanhamento. Hoje, mais de mil médicos utilizam esse recurso.
No B2B, a startup também vende o serviço para empresas em diferentes modalidades. Elas podem oferecer o programa como um benefício para os colaboradores (Azul, Boticário, Grupo Fleury e Sabará, por exemplo, optaram por este modelo) ou para seus clientes, como fazem a Abbott e a Porto Seguro. Atualmente, mais de 20 empresas usam o serviço da Vigilantes do Sono.
Há também empresas que funcionam como distribuidoras do programa, caso da Gympass e da Psicologia Viva, que oferecem o benefício para as organizações que atendem.
O projeto dos empreendedores é lançar em breve uma função dentro do aplicativo que permitirá realizar o monitoramento do sono das pessoas. Mais do que simplesmente combater a insônia, eles querem possibilitar que o usuário acompanhe, por exemplo, quanto tempo ficou na cama, quantas horas dormiu de fato, se roncou, qual seu nível de estresse no sono etc.
Aqui no Brasil, segundo os sócios, ainda não existe nada do tipo. Porém, segundo Lucas, aplicativos gringos como Smart Cycles e Sleep Android já somam mais de 50 milhões de downloads:
“Tem mais gente que procura por app para dormir do que para meditar”
A ideia é começar com um sleep tracker dentro do dispositivo do celular da pessoa e, em 2022, avançar para um modelo que envolva integrações com wearables.
Hoje, a Vigilantes do Sono contabiliza 35 mil downloads, e deve fechar 2021 com 300 mil reais de faturamento. O crescimento é bem-vindo, claro, mas traz novas responsabilidades — e dores de cabeça.
“Eu nunca tinha tido insônia… Até começar a empreender!”, brinca Lucas.
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