A inteligência artificial é tão ou mais revolucionária do que o surgimento do computador para o mundo da propaganda.
Quando a gente precisa de um tipo específico de personagem que não existe nos bancos de imagem, nem tem orçamento ou tempo para fotografar, a capacidade de reunir características físicas rapidamente na tela do computador – sem infringir direitos autorais – veio aprimorar a produção criativa.
As plataformas Midjourney, Dall-E2 e ChatGPT são apenas alguns exemplos mais populares de ferramentas de IA generativa já amplamente usadas nas agências.
Em se tratando de imagens geradas por elas, existe uma camada mais profunda sobre as implicações do uso dessas tecnologias.
No mês que se comemorou o “descobrimento” do Brasil, aqui na One estávamos criando uma campanha relacionada à data e, eis que, questionado por imagens de povos originários do Brasil, o Midjourney só nos apresentou figuras de indígenas norte-americanos, de filmes westerns, estereotipados ao extremo.
Simplesmente não há no acervo da ferramenta qualquer representação dos nossos povos originários, as etnias que formam nosso país. E isso é um reflexo da cegueira social (de todos nós) para uma cultura que foi esmagada pelo colonialismo
Assim nasceu a vontade de iniciar um movimento de mudança e, embasados pela expertise da empresa especializada em pesquisas de patrimônio cultural, Scientia Consultoria, lançamos o movimento Indígenas por “AI” (ou, na abreviação, AI, mesma sigla em inglês para Inteligência Artificial).
O objetivo é aumentar o volume de imagens digitais de indígenas brasileiros para que, no futuro, a IA tenha acervo real dos nossos povos originários.
O movimento convidou artistas brasileiros — dentre eles um time de artistas indígenas — para criar imagens relacionadas às nossas diversas etnias.
Uma dessas artistas indígenas participantes é a Potyra Terena, da etnia Terena de Mato Grosso. Nas palavras dela, o movimento busca “corrigir distorções e ampliar a visão sobre a contribuição cultural, social e ambiental das comunidades indígenas”.
Além disso, Potyra nos explicou que, ao destacar as experiências, conquistas e resistências das populações indígenas, o movimento traz à tona sua resiliência e o papel fundamental na formação da identidade nacional, ajudando a combater estereótipos negativos e promovendo o respeito pela diversidade cultural
Para ela, há também um papel importante em reescrever a história dos indígenas que enfrentaram apagamento ao longo dos séculos, além de ser uma forma crucial de promover justiça, respeito e valorização da rica herança cultural das comunidades, contribuindo para um entendimento mais completo e inclusivo da história nacional.
Reforço aqui que a Inteligência Artificial não tem a capacidade de pensar sozinha. Ela é reflexo da nossa sociedade, das nossas mazelas, preconceitos e exclusões.
Temos a oportunidade de manipular seus algoritmos para que elas representem, de maneira mais igualitária, a nossa diversidade.
Historicamente, todas as minorias que foram marginalizadas ou invisibilizadas (como os povos indígenas, os quilombolas, os afrobrasileiros, as mulheres, as pessoas LGBTQIA+, as pessoas com deficiência…) podem e devem ter a sua cara e a sua voz no mundo da Inteligência Artificial
A artista Kath Xapi Puri (da etnia Puri), que tem como território tradicional regiões dos quatro estados do Sudeste, traz em suas ilustrações a valorização da cultura e das narrativas originárias de Abya Yala (autodesignação dos povos originários para América).
Ela diz que, como indígena e artista independente, sua arte sempre carrega traços de sua cultura, mas percebe que artistas e pensadores indígenas, em geral, não têm muita visibilidade.
Complementando a fala da Kath, trago aqui o que escutei da Potyra: “Precisamos estimular oportunidades educacionais enriquecedoras, incentivando o aprendizado intercultural e a conscientização sobre a importância da preservação das línguas e tradições indígenas”.
Não se trata de um movimento isolado feito pela nossa agência. Longe disso.
O que fazemos é um convite para que qualquer pessoa, artista ou não, contribua inundando a internet com fotos, desenhos e ilustrações relacionadas a estes povos.
Se a evolução da IA é inevitável, vamos aproveitar o seu início para que os espaços sejam ocupados. É preciso garantir que as imagens sejam categorizadas de forma justa e respeitosa, evitando estereótipos e preconceitos
Assim, a IA poderá reconhecer e valorizar a diversidade cultural que existe no Brasil.
A difusão do patrimônio cultural brasileiro, reconhecendo sua riqueza, e respeitando os direitos culturais de todos os povos, pode começar com um simples tagueamento, como estamos propondo por meio do uso da hashtag #IndigenasPorAI nas redes sociais — e, assim, alimentarmos cada vez mais o universo digital.
Rodrigo Esteves é head de criação da agência One, do Publicis Group.
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