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O termo nem existia e a Mercur já era adepta do ESG: saiba como se faz uma empresa comprometida com as pessoas e o planeta

Angélica Weise / 25 nov 2021
Jorge Hoelzel, facilitador da Mercur (crédito: Mercur).
Angélica Weise - 25 nov 2021
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“A renovação da nossa cultura tem sido um processo de construção constante.” É assim que Jorge Hoelzel Neto, 60, facilitador da Mercur, resume a mentalidade que move as contínuas transformações por trás do negócio dessa (quase) centenária indústria gaúcha, fundada em 1924.

A Mercur fabrica derivados de borracha, desde aquelas de uso escolar até bolsas de água quente (os dois segmentos principais são de fato educação e saúde, incluindo-se também tecnologia assistiva). A companhia soma hoje cerca de 600 colaboradores e um faturamento anual de 100 milhões de reais.

Há cinco anos, contamos aqui no Draft as mudanças que a Mercur implementava em sua gestão interna, visando tornar a organização mais horizontal. Foi assim, aliás, que Jorge (integrante da terceira geração da família fundadora) viu seu cargo mudar de “diretor” para “facilitador”.

As transformações seguem em curso e extrapolam cada vez mais os limites do escritório. Em julho deste ano, por exemplo, a companhia começou a erguer sua própria usina fotovoltaica. Com tudo isso, dá para dizer que a Mercur é uma empresa ESG desde quando esse termo nem existia? 

“Não sei se fomos pioneiros, mas iniciamos um movimento importante com relação ao cuidado com nossas responsabilidades econômico-humano-socioambientais quando este assunto ainda era pouco tratado nas empresas”, diz Jorge, na Mercur desde 1986. “Ao mesmo tempo, temos consciência que ainda temos muito a fazer.”

A MERCUR HOJE É UMA EMPRESA CARBONO NEUTRO

Comprometida em reduzir os impactos ambientais de sua operação, a Mercur realiza (desde 2009)  o inventário de emissões de CO2. Naquele ano, a emissão encontrada na operação foi de 3 145 tCO2e. Em 2020, esse número já despencara para menos de um terço: 982 tCO2e. 

Diversas medidas ajudaram nesse esforço: enxugamento do portfólio de produtos; uso de etanol nos veículos da empresa; substituição de óleo na caldeira por lenha de eucalipto (plantada em terras da Mercur); corte drástico no número de viagens aéreas…

João Trinks, coordenador na área de Impactos das Atividades da companhia, conta como a Mercur compensa as emissões restantes:

“Hoje a modalidade escolhida é o plantio de mudas nativas, de acordo com o bioma onde serão plantadas, daquilo que não conseguimos reduzir. Para cada tCO2e (tonelada de CO2 equivalente), são plantadas 6,3 árvores. Isto torna a Mercur uma empresa Carbono Neutro” 

Além dessas iniciativas, a companhia busca reduzir as distâncias, comprando o máximo possível de fornecedores locais, próximos a Santa Cruz do Sul — contribuindo, assim, para aumentar a renda local e reduzir as emissões de CO2.

VEM AÍ UMA USINA SOLAR NOVINHA EM FOLHA

Outro projeto importante nesse sentido está começando a sair do chão. Em julho de 2021, a Mercur deu início à construção de sua própria usina solar. 

Em uma área de 2 hectares, junto à sede da empresa no distrito industrial de Santa Cruz do Sul, a usina com 2 652 painéis fotovoltaicos terá capacidade, inicialmente, de gerar 1,18MWp, suprindo 50% do consumo atual da Mercur.

Paulo Boufleur, coordenador técnico, explica que, com o aumento da conta de luz, a empresa precisava correr atrás de outras fontes:

“A previsão de início de geração é no final do primeiro trimestre de 2022. Assim, a Mercur reduzirá pela metade a necessidade de compra externa de energia

Desde 2013, a companhia já recorre ao Mercado Livre de Energia, tendo acesso a eletricidade gerada de fontes renováveis (PCH’s [Pequenas Centrais Hidrelétricas], eólicas, biomassa e solares). 

Porém, o acesso a essa energia se dá através da mesma rede de distribuição da concessionária (que gera perdas na transmissão) e não assegura que toda a energia realmente provenha destas fontes. Daí a decisão de erguer a usina.

AO PRIORIZAR A BORRACHA NATIVA COMO MATÉRIA-PRIMA, A MERCUR BENEFICIA INDÍGENAS E COMUNIDADES RIBEIRINHAS

Priorizar o uso de insumos renováveis é uma constante na Mercur. Há dez anos, resolvida a voltar a adquirir borracha natural como matéria-prima, a empresa tirou do papel o projeto “Borracha Nativa”. 

O facilitador da Mercur, Jorge Hoelzel Neto, esclarece que a iniciativa gera oportunidade e renda para as comunidades que ajudam a manter a Floresta Amazônica de pé:

Quando compramos borracha natural de regiões extrativistas da Amazônia, estamos comprando muito mais que borracha: estamos possibilitando a remuneração por um serviço ambiental de conservação das florestas e biodiversidade prestado pelos povos tradicionais

Em 2020, segundo a companhia, foram impactados 60 produtores, entre ribeirinhos e indígenas, em duas áreas protegidas do território da Terra do Meio, no Rio Xingu no estado do Pará, contribuindo com a proteção de aproximadamente 570 mil hectares. 

QUE TAL UMA BOLSA TÉRMICA FEITA COM ALGODÃO ORGÂNICO E CAROÇOS DE AÇAÍ?

Ação semelhante foi a confecção da bolsa térmica natural, lançada em 2019. O produto é feito com caroço de açaí juçara e algodão orgânico.

“A ideia de utilizar o caroço do açaí juçara, um subproduto do despolpe do açaí surgiu em 2017”, conta Jorge. Para transformar esse resíduo em matéria-prima, a Mercur precisou adaptar seu maquinário para lavagem e secagem dos caroços e adquirir um equipamento para a lixação.

No caso do algodão orgânico, o desafio era o preço, 300% acima do convencional. O dilema era: como manter o conceito do “comércio justo” sem extrapolar o valor percebido pelo consumidor no produto final? A saída da Mercur foi reduzir sua margem de lucro e convidar toda a cadeia de distribuição a seguir a mesma lógica.

Testes de laboratório comprovaram a eficácia do material no tratamento com frio e calor. Os protótipos foram validados com pacientes e profissionais de termoterapia. Uma agência de design ajudou a dar a forma final ao produto, mas preservando a cor natural do algodão, sem qualquer tingimento químico.

Hoje, a fabricação engaja pequenos produtores, por meio da cooperativa Econativa, de Três Cachoeiras (RS), incumbidos da despolpa do açaí, e também os cooperados da Justa Trama, que mobiliza a cadeia produtiva da fibra ecológica.

NA QUARENTENA, A MERCUR LANÇOU UM PLANTÃO DE ATENDIMENTO PSICOLÓGICO

Quando a Covid chegou, a Mercur precisou adaptar-se. Em março, todo o time foi para casa. A fase de home office total durou 40 dias.

“A ideia, desde o início, foi de proteger as pessoas de qualquer tipo de problema, tanto de saúde física, emocional ou financeira”, diz Jorge. 

“Proteger as pessoas”, no caso, significa tanto preservar os empregos quanto a sanidade dos colaboradores. A Mercur já oferecia acolhimento em saúde mental de forma contínua, mas pôs no ar um plantão remoto durante a quarentena. Mesmo assim, diz Caruline Corrêa, psicóloga da Mercur, apenas um funcionário recorreu a esse canal no período:

“Entendemos que os contínuos contatos via Lista de Transmissão da Mercur para todos os colaboradores passaram segurança e acolhimento, o que fez com que as pessoas não tivessem a necessidade de pedir ajuda por esse canal”

Caruline conta que, numa pesquisa com o time, vários dos funcionários expressaram segurança, mesmo em uma fase de incertezas

“Em função da parada em março de 2020, e das instabilidades que foram surgindo ao longo do ano e também em 2021, a nossa operação passou por várias dificuldades — mas que, de certa forma, nos impulsionaram para criarmos soluções inovadoras.”

O CAMINHO É SEGUIR INOVANDO (AGORA COM AJUDA DE STARTUPS)

Em 2021, a Mercur lançou sua Tese de Inovação, que deverá nortear as estratégias da companhia daqui em diante. O documento foi elaborado em conjunto com a Semente Negócios, após um trabalho de diagnóstico, análise de portfólio e estudo de tendências realizado pela consultoria.

“A Tese será revisitada periodicamente e modificada sempre que haja alguma alteração nos nossos objetivos ou nas tendências para as quais estamos olhando”, diz Cássia de Menezes Hoelzel, Articuladora de Inovação da Mercur. 

A companhia também se abriu à inovação aberta e lançou um desafio para startups no segundo semestre do ano. O objetivo é se conectar com empresas que tragam novas soluções em uma gama de temas, da gestão de treinamentos à redução do uso de plástico (que aliás a Mercur já vem abandonando desde 2012, quando os produtos do portfólio de saúde passaram a ser embalados em papel-cartão).

“Com todas essas iniciativas, nossa meta não é de chegarmos em algum lugar ou em algum ponto finito”, diz Jorge, “mas sim de nos mantermos sempre em evolução, ampliando nossos impactos positivos à medida que nossa consciência evolui.”

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