A publicidade de rua — ou mídia exterior — só fica atrás da TV aberta e da internet em termos de investimento, segundo uma pesquisa com 197 agências, atualizada em agosto de 2021
Se depender da Mobees, a distância entre essas modalidades de propaganda vai se reduzir cada vez mais.
A startup carioca instala telas de LED em cima de carros de transporte por aplicativo, dando mobilidade à mídia exterior e transmitindo anúncios de forma ininterrupta e inteligente. Fábio Barcellos, 48, cofundador e CEO da Mobees, afirma:
“Nossa crença é que a rua é a próxima fronteira da internet. Com o desenvolvimento tecnológico, internet das coisas, 5G e a queda de preço dessas tecnologias, a rua pode virar uma tela de internet”
Chamados de “buzzers”, os dispositivos, desenvolvidos pela startup, medem 100cm x 40cm e são instalados no teto do carro.
Cada um desses aparelhos é equipado com duas telas (96cm x 32cm) para a projeção dos anúncios e sensores que permitem extrair informações do ambiente e assim segmentar as campanhas.
COMO LEVAR PARA AS RUAS UMA EXPERIÊNCIA PARECIDA COM A DA INTERNET
Fundada em 2020, a Mobees afirma ser pioneira nesse serviço na América Latina.
A ideia começou a tomar forma no ano anterior, enquanto os sócios buscavam oportunidades para empreender em setores que ainda não tivessem sido transformados pela digitalização.
Além de oferecer às marcas uma alternativa de mídia OOH (Out Of Home) digital, geolocalizada e sobre rodas, a Mobees surge como uma opção de complemento de renda para essas pessoas.
“De um lado, tínhamos profissionais que representavam uma plataforma praticamente ilimitada para crescimento e que buscavam uma renda extra sem precisar trabalhar mais. E, do outro, marcas que gostam de anunciar na rua, mas querem reproduzir nela a mesma experiência da internet”
Hoje, 200 motoristas rodam as ruas do Rio de Janeiro carregando as telas — e os conteúdos dos anunciantes — da Mobees no topo do veículo, enquanto transportam seus passageiros.
UMA OPÇÃO DE COMPLEMENTO DE RENDA PARA MOTORISTAS DE APLICATIVO
A alta de combustíveis e a menor circulação de pessoas devido à pandemia vêm levando motoristas de aplicativo a desistir da atividade. Nesse contexto, a renda extra garantida pela startup vira um alento.
Os motoristas precisam circular ao menos 40 horas por semana para receber um valor fixo de 500 reais por mês. A esse valor, soma-se uma taxa mensal variável, que depende da performance da empresa (e pode chegar a mais 500 reais, no máximo). Fábio afirma
“A maioria dos motoristas de aplicativo dirige até 12 horas por dia, seis dias por semana, por conta da dificuldade de garantir uma renda mínima, o que consideramos uma distorção do modelo de trabalho. Queremos ajudá-los a trabalhar menos, algo perto dessas 40 horas semanais”
Segundo o empreendedor, cerca de 95% dos motoristas que trabalham com a Mobees garantem ao menos o valor da taxa fixa todo mês. Ao longo de 13 meses, ainda de acordo com a startup, esses 200 motoristas parceiros ganharam, somados, quase 1 milhão de reais pelo trabalho.
A instalação do dispositivo demora 20 minutos e é realizada na base operacional da startup, em Bonsucesso, na Zona Norte do Rio. Lá fica também a sala de controle, com os painéis de acompanhamento de performance dos motoristas e dos buzzers.
O PROTÓTIPO FOI CRIADO DENTRO DE UM QUARTO DE HOTEL NA CHINA
Fábio já tinha bagagem empreendedora como fundador e sócio da QuickLessons, edtech de cursos online, e CEO da Affero Lab, voltada para educação corporativa. Para tirar a Mobees do papel, ele se juntou a Flávia Coelho e José Lyra Júnior, que hoje atuam respectivamente como CMO e CTO da empresa.
Os sócios logo identificaram que havia interesse pelo conceito — tanto da parte dos potenciais anunciantes quanto dos motoristas de aplicativos. A cidade do Rio não impôs grandes barreiras regulatórias que inviabilizassem o modelo de publicidade da startup.
O principal desafio acabou sendo desenvolver a tecnologia. Os empreendedores se assustaram ao descobrir que não havia, no Brasil, nenhuma empresa hardware disponível para criar o tipo de aparelho que a operação requeria.
“A gente sabia o que queria, mas construir o protótipo aqui pareceu algo moroso — e com risco alto de não dar certo”
Fábio e o sócio José então fizeram as malas e partiram para a China. Ao longo de 15 dias, visitaram dez fábricas chinesas, selecionaram as três mais adequadas, compraram as peças lá mesmo e montaram um protótipo dentro do quarto de hotel.
Ao verem que uma primeira configuração funcionaria, ainda que fosse necessário implementar melhorias no futuro, fecharam negócio com os fornecedores.
O NEGÓCIO ESTAVA PRONTO, MAS A COVID ATRASOU O LANÇAMENTO
Garantir uma quantidade mínima de telas rodando nas ruas demandava capital de risco. Enquanto batalhavam para lançar a empresa, os empreendedores foram atrás de investimento.
A primeira rodada ficou aberta de dezembro de 2019 a março de 2020. Entraram como líderes em investimento a Canary e a Norte, além de investidores-anjos. Esse primeiro aporte alcançou 7 milhões de reais. E chegou quando a Covid batia à porta:
“A rodada acabou cinco dias antes da pandemia estourar no Brasil. Estávamos com tudo pronto para o lançamento no dia 30 de março, mas obviamente tivemos que segurar — e lançamos três meses depois, dia 1º de julho”
Doze meses depois, em julho de 2021, um novo aporte encheu o tanque da Mobees, dessa vez com o valor de 5,5 milhões de reais. A grana veio do WE Ventures, fundo criado pela Microsoft para incentivar startups de tecnologia que têm mulheres — como a CMO e sócia Flávia Coelho — na liderança.
“Ter [o apoio de] uma big tech nos confere uma retaguarda de desenvolvimento tecnológico muito forte para os próximos anos”, diz Fábio. “Nosso negócio pode ser levado para qualquer lugar. O que falta é as marcas entenderem os benefícios e abraçarem o formato.”
A EMPRESA ATENDE DESDE NEGÓCIOS LOCAIS ATÉ GRANDES MARCAS
As marcas aos poucos vêm sim abraçando o formato. Apesar dos solavancos da pandemia, a Mobees conquistou 30 clientes ao longo de um ano de operação.
Esse portfólio inclui de negócios locais a grandes marcas (Oi, Casas Bahia, Johnnie Walker), além de pelo menos uma scale-up: a edtech Descomplica, que foi pauta aqui no Draft (e segue como cliente da Mobees até hoje).
O negócio, diz o empreendedor, vem crescendo a uma média de 10% ao mês. O desempenho chama atenção, ainda mais levando em conta o constante abre-e-fecha do comércio nestes tempos pandêmicos:
“Tudo isso mexe com o apetite das marcas para anunciar, porque não teria tanta gente nas ruas. E existe também uma questão prática e de posicionamento, já que algumas empresas preferiram adiar gastos”
Mesmo que ainda não tenhamos chegado ao fim da pandemia, o reaquecimento do mercado e o aumento da procura das marcas fazem a Mobees prever que agosto será o seu melhor mês desde o início da operação.
O SISTEMA PERMITE MUDAR A ESTRATÉGIA NO MEIO DA DIVULGAÇÃO
Os dispositivos instalados em cada veículo têm sensores embutidos que identificam o gênero, a faixa etária e o número de pessoas impactadas pela propaganda em um raio de até 30 metros.
Segundo Fábio, os sensores são capazes de reconhecer até o fabricante do celular usado por cada pessoa (o que ajuda a inferir sua classe social e interesses de consumo).
E como as telas estão conectadas a um sistema online, é possível alterar a estratégia no meio da divulgação, o que dá flexibilidade ao modelo.
“Quem aprender a usar tudo que a gente oferece vai criar diálogos muito mais interessantes e assertivos com o público na rua do que as marcas estão acostumadas”
A Mobees não oferece pacotes fixos, nem preços tabelados ou contratos por tempo mínimo. Cada marca decide quanto quer investir na estratégia conforme o número de vezes em que o anúncio vai aparecer.
Para quem quer gastar pouco, o recomendado é determinar pontos de interesse, de acordo com a concentração do público-alvo.
“Como na internet, cada budget traz um impacto proporcional. Segmentar bem é o segredo.”
ENTRE OS CLIENTES ESTÃO OI, CASAS BAHIA E JOHNNIE WALKER
A funcionalidade de geolocalização dos dispositivos da Mobees, diz Fábio, agradou à Oi, que estava lançando o Oi Fibra no Rio. Assim, foi possível mapear as regiões em que o serviço estava disponível, concentrando a divulgação nas proximidades.
Para as Casas Bahia, a estratégia foi semelhante: a marca ganha prioridade e aparece com mais frequência nas telas da Mobees quando o carro se aproxima de uma das mais de 40 lojas da cidade.
Em março, mês das mulheres, a startup foi acionada para rodar uma campanha da Johnnie Walker, que queria desfazer a ideia de que uísque é bebida “para homens”.
“A Mobees mapeou mais de 300 pontos de venda da marca e conseguiu mostrar qual impacto e porcentagem do investimento foi direcionado para um raio de até 300 metros de cada estabelecimento. Foi usada uma funcionalidade de ponto de interesse — uma forma de segmentar a campanha não só por bairros, mas por raios em relação a pontos de interesse pré-determinados”
Não existe um tempo mínimo para anunciar com Mobees. A maior parte das marcas mantém suas campanhas durante, pelo menos, um mês.
“Nossa visão é que o mercado irá cada vez mais pro modelo always on e usar a mídia de rua como se faz na digital.”
COMO USAR OS SENSORES DA MOBEES PARA VIABILIZAR CIDADES INTELIGENTES
Por enquanto, a startup assume a função de fazer o upload dos conteúdos para os clientes. No futuro, porém, a ideia é adotar um modelo de autosserviço, como os clientes operando a plataforma diretamente, como ocorre em ferramentas de marketing digital do Google e do Facebook.
O empreendedor também destaca o potencial da Mobees para alavancar cidades inteligentes, por meio dos sensores hoje usados para mapear o público-alvo das campanhas.
“Conseguimos captar várias informações via sensores nas nossas telas, dados relevantes, como nível de iluminação da rua, buracos na pista, qualidade do ar, poluição sonora… Nenhum outro formato roda nas ruas com a mesma amplitude que a gente”
Esse desdobramento da tecnologia é levantado nas conversas em andamento com prefeituras, que poderiam usar a tecnologia da Mobees para tomar decisões mais embasadas.
“Também podemos servir como mais um canal de comunicação da cidade com a população, trazendo informações sobre vacinação, trânsito, clima, enchente etc., de forma segmentada.”
O PLANO É DOMINAR O RJ E DEPOIS ALCANÇAR DEZ CAPITAIS DO PAÍS
Por enquanto, a startup opera apenas na capital fluminense. O plano é expandir em breve para outros municípios do estado. E, em seguida, alcançar dez capitais brasileiras — além de um punhado de metrópoles latino-americanas.
Maior mercado do país, São Paulo aparece nesse roadmap, claro, mesmo com a legislação mais restritiva quanto à publicidade de rua (há 15 anos, a Lei Cidade Limpa proíbe a instalação de outdoors e pinturas em fachadas que façam propaganda de empresas ou produtos).
“Talvez a gente tenha que entrar em cidades do entorno e mostrar os benefícios que a capital poderia ter em flexibilizar o formato”, diz Fábio.
Esses pormenores regulatórios demandam um planejamento ainda mais cirúrgico na hora de projetar a expansão. Mas, para o empreendedor da Mobees, o grande desafio da startup permanece o mesmo: romper de vez os modelos de publicidade já estabelecidos no mercado.
“Queremos mostrar que existe outra maneira [de fazer publicidade] muito mais eficiente — e com custo mais acessível.”
Alvo de um processo da Uber, a StopClub ganhou fama com uma ferramenta que permite recusar corridas automaticamente. Para além da polêmica, saiba como a startup carioca quer tornar a rotina dos motoristas de app mais fácil e segura.
A pandemia destravou o trabalho remoto, mas recrutar colaboradores ainda é um desafio. Saiba como a Ollo usa tecnologia e curadoria de talentos para encontrar em até 48 horas o profissional que a sua empresa precisa.
Em um mercado de trabalho cada vez mais complexo, a formação universitária muitas vezes é insuficiente. Saiba como a DNC combina cursos online e parcerias com empresas para aumentar a empregabilidade e a qualidade da mão de obra.