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Como se cria um time campeão de robótica? Os bastidores do título mundial do Red Rabbit!

Bruno Leuzinger / 24 ago 2018
A equipe do SESI de Americana (SP) vibra em Houston, no Texas, com a vitória na final da First LEGO League
Bruno Leuzinger - 24 ago 2018
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Em abril de 2018, um time do interior paulista viajou ao Texas para alcançar uma façanha: o primeiro título mundial de robótica do Brasil! Escalado com cinco moças e três rapazes de 12 a 16 anos, o Red Rabbit, do SESI de Americana (SP), bateu 107 equipes de 43 países numa disputa acirradíssima para “levantar o caneco” do World Festival, na categoria First LEGO League, em Houston, no Texas.

À frente deste time campeão está o técnico Denis Santana, 31. “Ainda estamos vivendo o título, a ‘ficha’ vai caindo a cada dia!”, diz. O curioso é que até 2009 ele era treinador de uma escolinha de futebol em Americana (a 140 quilômetros da capital paulista). Entrou para o SESI como estagiário de Educação Física, que cursava na época, e foi assim que soube, por acaso, de uma vaga de professor de Informática, para comandar a equipe. “Quando pintou a vaga, disse para mim mesmo: vou arriscar, não tenho nada a perder…”

Arriscou, venceu – e lá se vão nove anos no comando da equipe, que nasceu com o nome de Legologia e virou Geek Tech antes de assumir de vez Red Rabbit e o vermelho como cor do uniforme. “Até hoje, já trabalhei com 54 alunos”, diz Denis, orgulhoso, destacando como a participação no grupo impacta positivamente a atuação escolar, permitindo aos jovens “largar na frente” dos demais:

“Os professores relatam como eles se destacam em relação aos alunos que não participam [da turma de robótica]. O construtor de robô, quando chega no Ensino Médio, já sabe alguns conceitos de Física, isso vai dando uma facilidade de aprendizado que se reflete categoricamente no dia a dia da escola.”

Quando se fala em robótica, há várias vertentes paralelas. A First LEGO League (FLL) é a modalidade com maior número de equipes no Brasil. Só no estado de São Paulo são mais de 200 times em atividade, 80 deles apoiados pelo SESI. Podem participar alunos de 9 a 17 anos, em equipes de oito: seis do Ensino Fundamental e dois do Médio. Operados nas competições, os robôs são fabricados pelos jovens com sensores, motores e outros componentes da linha LEGO Mindstorms, voltada para educação tecnológica.

O título mundial da Red Rabbit foi inédito, mas no ano passado o Brasil já tinha “batido na trave”, com o vice-campeonato dos Thunderbóticos, do SESI de Rio Claro (SP). E neste ano, as Jedi’s, do SESI de Jundiaí (SP), também foram superbem: o time formado apenas por meninas conquistou seu lugar no pódio, ficando em terceiro lugar.

O calendário da FLL segue um cronograma global. Em agosto, a organização divulga o tema da temporada (na edição 2018/2019, o tema será Into Orbit – “Em Órbita”). As equipes avançam conforme seu sucesso nas seletivas: regional, estadual (realizadas entre novembro e dezembro, no caso de SP, e nos meses seguintes em outros estados), nacional (março) e por fim o grande campeonato mundial, sempre em abril.

A cada etapa, são quatro critérios de avaliação. No Desafio do Robô, os times têm 2 minutos e meio para levar seu robô a cumprir, numa “arena de jogos”, o maior número possível de um total de 14 missões, com níveis de complexidade e pesos distintos. As tarefas se relacionam ao tema: na temporada passada, os robôs precisavam desempenhar funções ligadas à água, como acionar uma torneira ou reparar um encanamento.

O Desafio do Robô define a faixa de corte: só os 40% melhores mantêm chances de título. Paralelamente, os concorrentes passam por bancas de avaliação. Em uma das salas, chamada de Core Values, os jurados analisam, por meio de perguntas, a dinâmica do trabalho em equipe. A ideia é evitar, por exemplo, que um único aluno “carregue o time todo nas costas”.

Na sala Design do Robô, o júri analisa minuciosamente os aspectos mecânicos e de programação – os jovens precisam ter tudo documentado direitinho em um portfólio. Além disso, os times são julgados por seu Projeto de Pesquisa, vinculado ao tema da temporada. “Você precisa fazer uma investigação dos problemas, encontrar uma solução inovadora ou aprimorar uma existente e apresentar os valores agregados, tudo em cinco minutos”, diz Denis.

No dia a dia, os encontros da turma de robótica do SESI de Americana ocorrem sempre à tarde, a partir das 13h, no contraturno dos estudos regulares. Em princípio, duram três horas – mas vão se intensificando e consumindo feriados e fins de semana conforme a temporada avança. “O trabalho se afunila na reta final”, diz Denis. “Já chegamos a treinar dez horas direto!” Enquanto parte do grupo se concentra no projeto de pesquisa, outros ficam focados na construção do robô; ao longo dos meses, um rodízio de funções ajuda a garantir que todos dominem um pouco de tudo.

O técnico da Red Rabbit revela que a jornada que culminaria no título mundial foi cheia de percalços, sobretudo na preparação para o campeonato brasileiro.

“Essa foi uma das nossas temporadas mais conturbadas!”, diz Denis. “Um dos perfis mais difíceis de você encontrar é o de programador. E, em janeiro, nossa programadora mudou de escola! Também em janeiro, identificamos que o nosso projeto de pesquisa não estava tão bem avaliado e, por uma estratégia de competição, decidimos mudar, recomeçando do zero!”

O projeto anterior era relacionado a desperdício de água na produção de alimentos. A nova pesquisa enfocou um problema totalmente distinto, que afeta uma parcela da população frequentemente esquecida:

“Os alunos identificaram que idosos em asilos não sentem a necessidade de beber água. Descobrimos que às vezes eles dão entrada no hospital com um problema renal, mas na verdade a causa [dos sintomas] é a desidratação. Criamos um projeto de um software em que você cadastra o idoso, calcula pelo seu peso a quantidade de água necessária por dia e vai monitorando, enviando alertas para o cuidador.”

O regulamento permite liberdade de formato para a apresentação da pesquisa, e o time Red Rabbit decidiu inovar montando uma peça teatral – uma sacada esperta para transmitir a mensagem de forma criativa, cativando os jurados. Desenvolver um protótipo da solução não era obrigatório, mas a equipe deu um passo à frente para materializar a ideia. “Fizemos uma parceria com um engenheiro de Americana, que desenvolveu o software com a gente.”

A Red Rabbit terminou o campeonato nacional em quarto lugar, classificando-se por um triz para o Mundial – só os quatro primeiros garantiam vaga. E o remanejamento no desempenho de funções após a saída da programadora acabou revelando um novo talento na área: “A Luísa [Boselli] começou a programar em janeiro, estudou muito… Ela era a mais nova do time na época, tinha só 12 anos… E ganhou o título de melhor programadora do Nacional!”

Entre a confirmação da vaga e o Mundial foram só 28 dias. Um prazo corridíssimo para resolver burocracias de passaporte e visto, traduzir a apresentação e o portfólio, ajustar aspectos do que não tinham funcionado bem nas seletivas… “Quando chegamos no World Festival, para ser sincero, não sabíamos qual era o nosso potencial na competição”, diz Denis. “Até o Nacional, tínhamos ficado corrigindo problemas, mas sempre trabalhando…”

Chegando em Houston “aos trancos e barrancos”, parecia que a equipe Red Rabbit estava fadada a repetir aquela famosa e fatídica frase atribuída aos astronautas da missão Apollo 13 (em 1970), que jamais pisaram na Lua: “Houston, we have a problem…”. No entanto, o time conseguiu ficar dentro da nota de corte, foi avançando e…

“Quando anunciaram que o vencedor era o projeto de hidratação de idosos… Nossa, foi inacreditável, todo mundo chorando!”, diz Denis, revelando que no calor do anúncio deu entrevistas das quais já nem se recorda mais. “Aí, o pessoal da organização levou a gente do centro de convenções para o estádio do Houston Astros, o time de beisebol da cidade… Um estádio enorme, lotado, onde fomos chamados para receber o prêmio… Foi muito emocionante!”

Se no futebol o Hexa ficou para o futuro, a certeza hoje é que a nossa garotada da robótica já está “batendo um bolão”.

“Ganhar o World Festival nem era um sonho, de tão ‘longe’ que estava… E a gente conquistou!”

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