Logo que terminou o mestrado em Ciências da Computação, em 2009, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o cearense Victor Fernandes fez as malas, vendeu o carro e, com a grana, se mandou para a Austrália.
Oficialmente, o objetivo era estudar inglês. Por trás dessa intenção legítima havia outro interesse: conhecer as praias e surfar as ondas perfeitas do mar do Pacífico. Victor, que hoje tem 36, lembra:
“Foram sete meses de aventuras. Morei em Gold Coast, a capital do surfe da Austrália. A vontade de pegar ondas era tão grande que fiz até uma viagem de carro de mais de 3 mil quilômetros, indo do leste ao sul do país pela costa”
Sete anos depois (e com dezenas de outros destinos de praia já carimbados no passaporte), Victor fez da paixão pelo surfe o seu ganha-pão. Em 2016, ele fundou a Surfmappers, empresa que conecta fotógrafos e surfistas num marketplace com cara de rede social.
A plataforma tem hoje 2 mil fotógrafos cadastrados, que todo mês disponibilizam cerca de 1,5 milhão de fotos, em álbuns catalogados com os nomes das praias, dias e horários em que foram feitos os registros.
Praias como as cariocas Arpoador, Macumba e Barra da Tijuca, as paulistas Pitangueiras, São Pedro e Tombo (todas no Guarujá), e as catarinenses Joaquina, Praia Mole e do Moçambique, em Florianópolis, estão entre as mais clicadas pelos fotógrafos da Surfmappers.
Do outro lado da tela, a plataforma atrai 150 mil usuários, grande parte surfistas amadores, que buscam e adquirem suas fotos. As transações podem ser feitas em real, dólar ou euro. A Surfmappers gera receita ao cobrar uma taxa de 20% sobre as vendas.
Há poucos dias, a Surfmappers aprimorou a plataforma com foco na usabilidade do usuário e vantagens para os fotógrafos.
Antes, já era possível seguir o perfil dos seus fotógrafos preferidos, mas não havia canais de comunicação direta. Agora, por meio de geolocalização, os surfistas sabem, em tempo real, quais profissionais estão na praia – e podem, previamente, combinar encontros e contratar serviço de transporte para levar os profissionais aos destinos.
Curtiu as fotos e quer usá-las para além das redes sociais? O aplicativo oferece a venda de painéis e imagens emolduradas, com opções de materiais, tamanho e qualidade de impressão; o usuário recebe tudo em casa.
“O surfe é um esporte com estética incrível para fotos”, diz. Mas conta aí, Victor: o que faz uma foto de surfe ser boa?
“As principais variáveis são a luz, nitidez e a relação harmoniosa entre a água, o surfista e a paisagem ao fundo… Mas a escolha depende de quem está surfando. Um surfista mais experiente, por exemplo, gosta de fotos de uma manobra difícil ou que ele ainda não tinha acertado”
Com câmeras que fazem mais de 10 cliques por segundo, os fotógrafos captam manobras do começo ao fim. Em média, cada foto custa 20 reais, e o pacote com 10 sai por 70 reais.
Além do surfe tradicional, Surfmappers atua com windsurfe, kitesurfe e stand-up paddle. “Para a gente, pisou na areia com prancha é surfe.”
Durante nove anos (e mesmo depois de empreender), entre 2012 e 2021, Victor trabalhou na Anchor Loans, empresa de empréstimos com sede nos EUA. Sua última função foi gerente de projetos de Tecnologia da Informação.
A ideia de criar a Surfmappers surgiu da vontade de ter uma foto sua no mar. Na época Victor já surfava há mais de 10 anos, mas nunca tinha conseguido um registro de suas ondas:
“Havia um desencontro entre os surfistas e os fotógrafos. Era comum ver pessoas com câmeras na areia. Mas, quando saía do mar, muitos já tinham ido embora e não dava para saber quem tinha feito foto minha”
O próprio Victor tinha o hobby de fotografar amigos pegando onda. Ele, então, buscou na internet negócios de fotografia de esporte. Encontrou plataformas que vendiam fotos de corrida de rua (e se tornaram referências na montagem do negócio).
A pesquisa trouxe a descoberta de uma oportunidade. Em 2016, a revista Fluir, a principal publicação brasileira sobre surfe, encerrou sua operação.
Naquela época – e ainda hoje – o mercado de mídia e jornalismo passava por uma reorganização, com queda das receitas publicitárias nos veículos impressos, demissões em massa e migração de negócios para a internet.
“Os fotógrafos estavam diante de um novo cenário: não venderiam mais fotos de surfistas famosos para revistas. Agora, teriam que vender fotos para surfistas amadores, a preço bem menor e com muito mais volume. Mas como vender para 500 pessoas por mês?”
Se por um lado os profissionais sentiam na pele o baque de serem demitidos de publicações impressas, por outro lado as redes sociais ganhavam potência como canais de mídia e permitiam descentralizar a produção de conteúdos de surfe.
Foi aí que Victor teve a sacada e encontrou o propósito do seu futuro negócio: gerar renda para fotógrafos experientes e abrir espaço para novos profissionais.
Em poucas semanas, o empreendedor criou o aplicativo beta da Surfmappers – tudo sozinho e com investimento próprio, de 40 mil reais. Na base da paciência e resiliência, lançou o negócio em 2016.
O primeiro canal de comunicação foi uma página no Instagram, usada também para prospectar surfistas amadores e fotógrafos. A primeira venda aconteceu após três meses.
“Modelos de negócios de marketplace exigem muito capital inicial. Ao mesmo tempo, no início da startup praticamente não há geração de caixa… Criei uma operação enxuta, com margem em torno de 15%, que era reinvestida na empresa. Foi bem bootstrapping mesmo”
Com surfistas e fotógrafos dentro da plataforma, a curadoria de profissionais passou a acontecer de forma orgânica. Os autores das melhores fotos ganham popularidade, conquistam seguidores e inspiram os novatos.
Um caso interessante é o de Sebastian Rojas, um dos mestres da fotografia de surfe, que trabalhou para a Fluir por 30 anos. Sebastian se tornou parceiro da Surfmappers, com produção de conteúdo digital e cursos para novos fotógrafos.
Para reter bons profissionais, a Surfmappers bolou alguns benefícios — daí os cursos oferecidos por Sebastian através da plataforma.
A empresa também mantém um blog e canal de YouTube que reúnem dicas sobre escolhas de câmera, técnicas de fotografia e relacionamento com clientes. Além disso, firma parcerias com lojas e seguradoras de equipamentos, que oferecem descontos para os fotógrafos da rede.
A estratégia, diz Victor, vem dando certo e ajudando a impulsionar novas carreiras:
“Há casos de jovens de baixa renda que começaram a fotografar, investiram em equipamentos e técnica e, com a profissionalização, transformaram as suas vidas”
Segundo o empreendedor, na rede da Surfmappers há gente que já transacionou 200 mil reais nos últimos dois anos. Paralelamente, alguns hoje fornecem fotos para grifes e fabricantes de equipamentos de surfe.
Em 2021, a Surfmappers foi selecionada para o programa da WOW, aceleradora brasileira independente de startups composta por cerca de 220 investidores-anjo.
Ao longo de 12 meses, a empresa participou de treinamentos e mentorias em produto, marketing e mercado (tudo remotamente, devido à Covid-19). O programa incluiu ainda um investimento de 200 mil reais na Surfmappers.
Esse recurso permitiu a criação do novo aplicativo e também vem sendo alocado para crescer a equipe e a empresa, que fechou 2021 com um faturamento de 2 milhões de reais — a meta é dobrar essa quantia em 2022.
Hoje são 12 funcionários fixos, entre desenvolvedores de software, engenheiros de computação, designers, produtores fotográficos e pessoal de marketing. Parte do time trabalha em esquema remoto. A empresa mantém ainda um escritório dentro da incubadora INOVA-IMD, na capital potiguar.
A startup pretende agora expandir para Portugal. Além da facilidade de idioma, Victor lembra que o país tem praias incríveis, como Carcavelos, que fica a meia hora de carro de Lisboa, e a de Nazaré, famosa pelas ondas gigantes.
Ao empreender fazendo aquilo que gosta, ele conta que hoje só uma coisa perturba a sua tranquilidade:
“O que me tira o sono é a previsão ruim do mar e das ondas: aí, nem eu e nem os usuários da Surfmappers podemos surfar. É só prejuízo!”, diz Victor, aos risos.
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