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A disrupção da indústria fonográfica não tem volta. Para se adaptar, a Sony Music desbrava novas frentes de negócio

Adriana Fonseca / 9 jan 2020
Wilson Lannes, VP de Business Development da Sony Music: a área hoje representa 10% do lucro no país.
Adriana Fonseca - 9 jan 2020
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Em 2016, mesmo com o boom do streaming, mídias físicas como CDs e DVDs ainda representavam 40% do mercado brasileiro. O que impressiona é a velocidade da queda. Segundo a Federação Internacional da Indústria Fonográfica, essa participação despencou — só nos últimos três anos — para míseros 1,4%. 

Por outro lado, o mercado de música digital cresceu 38% em 2018 na comparação com 2017, puxado principalmente pelo consumo via streaming, que subiu 46% no período. Só o Spotify tem hoje mais de 248 milhões de usuários em 79 países.

Não é segredo: o mercado fonográfico vive uma revolução. E as gravadoras — entre elas, a Sony Music Brasil — se viram numa corrida desenfreada para “correr atrás do prejuízo” e repensar seus modelos de negócio. Segundo Wilson Lannes, 46, vice-presidente da área de business development, criada em 2009:

“A empresa percebeu, naquela época, que era preciso diversificar os negócios e criar novas formas de gerar valor. Vendo essa mudança no mercado, tivemos que mudar a forma de fazer marketing, como lançamos produtos e como trabalhamos as músicas do lado da gravadora”

Chamada internamente de BD, a área de desenvolvimento de novos negócios da Sony Music se divide em três frentes: Brands, Live e Product Placement

MÉTRICAS AJUDAM A DEFINIR O MELHOR ARTISTA PARA CADA CAMPANHA

“Brands”, o primeiro pilar, é basicamente um trabalho de curadoria musical. Empresas procuram a Sony Music para definir qual artista vai embalar o vídeo do seu próximo produto ou campanha institucional. “Temos uma área dentro de ‘Brands’ chamada ‘Sincronização’, que faz esse tipo de curadoria”, diz Lannes. 

A escolha do artista para atingir o público-alvo que o cliente quer não tem nada de aleatória. Segundo Lannes, para chegar ao “match” entre marca e artista, o time da Sony analisa métricas e comportamento de consumo. 

“Temos uma área que acompanha a audiência de cada faixa e artista nos serviços de streaming parceiros, levando em conta os momentos de consumo, a localização geográfica e o gênero do usuário. Olhamos esses dados para saber qual artista alocar em cada show e campanha”

A Unimed Grande Florianópolis, por exemplo, contratou a gravadora para pensar a trilha sonora de uma campanha (lançada em agosto deste ano). Depois de entender o briefing, a mensagem e o público a ser atingido, a Sony apresentou opções de música — no caso da campanha, a escolhida foi “1+1= 2”, da dupla Dois é Par

ALÉM DE CURADORIA, A GRAVADORA ORGANIZA SHOWS EXCLUSIVOS

Às vezes, a demanda não se resume à curadoria: o cliente também quer contratar o artista para um show exclusivo. Nesse caso, as frentes “Brands” e “Live” se entrelaçam.

Durante a Rio 2016, por exemplo, a Sony Music foi acionada pelo Consulado do Japão. Como o país sediaria os Jogos seguintes, em 2020, o consulado queria encomendar um evento que divulgasse sua cultura. Foram dois dias de balada na casa de shows Vivo Rio, com um line-up by Sony que incluiu artistas como Emicida, Vanessa da Mata, Tokyo Ska Paradise Orchestra e a cantora nipo-brasileira Marcia. 

Tokyo Ska Paradise Orchestra em ação no show promovido pelo Consulado japonês: evento com curadoria da Sony Music.

No ano passado, em março, quando a Mercedes-Benz Brasil lançou no país o novo modelo de Classe A, contratou a Sony para identificar um artista que se “conectaria” com seu público-alvo (no caso, jovens de alto poder aquisitivo). A escolhida foi , nome artístico da cantora dinamarquesa Karen Marie Aagaard Ørsted Andersen. Coube à Sony entrar em contato, checar agenda e organizar o show.

Outro job foi para a Calvin Klein, que em junho de 2018 abriu sua loja na rua Oscar Freire. Pinçada pela Sony Music, a dupla de DJs Evokings — formada por Thiago Cymbal e Wagner Farias — comandou a pista na festa de inauguração. 

UM PROJETO GLOBAL COM A REDE IBIS PARA FOMENTAR NOVOS ARTISTAS

Ainda nessa mescla entre “brands” e “live”, a Sony Music fechou em 2019 um projeto global com a rede Ibis, bandeira do grupo Accor, para fazer a curadoria de shows realizados em hotéis da marca. A proposta era dupla: oferecer uma experiência diferente aos hóspedes e fomentar novos artistas. Segundo Lannes:

“Entendemos a música como um ativo que conecta as pessoas. Quando se faz a associação correta, a marca ganha valor”

No projeto, definido em conjunto entre cliente e gravadora, a Sony Music organizou, ao longo de 2019, 44 shows em 17 países. No Brasil, o representante escolhido para o Ibis Music foi Lucas Lucco, que fez dois “pocket shows” exclusivos para hóspedes, um no Ibis São Paulo Expo Barra Funda e outro no Ibis Rio de Janeiro Copacabana Posto 5. 

Além dos shows nos hotéis com os “headliners”, o Ibis Music teve um concurso com 87 novos artistas, que, além de realizarem suas próprias apresentações, receberam mentoria do artista-embaixador local do projeto (por aqui, o próprio Lucas Lucco). A atração terá uma nova edição em 2020.

MARCA NATIVA DIGITAL DA SONY, O FILTR MIGROU DO ONLINE PARA O OFFLINE

A mais recente inovação da Sony Music no pilar de “Live” foi o avanço da plataforma digital Filtr para o “mundo físico”, em 2019. 

O Filtr surgiu em 2018 como uma marca nativa digital da Sony Music global. São playlists de música e humor disponibilizadas em serviços como Spotify e Deezer e consumidas por um público jovem. A seleção feita pela Sony inclui artistas de outras gravadoras.

“O Filtr existe para facilitar o consumo de música, mas não gerava dinheiro diretamente. Nossa missão era gerar receita e valor para esse produto e a partir daí veio a ideia de levá-lo para o mundo offline”

Para monetizar a marca, o time de BD criou o Filtr Live, uma série de shows (foram 16 até aqui). A Sony Music capta patrocinadores — daí vem a receita direta –, faz a curadoria de line up e desenvolve ações de engajamento.

Em setembro, a Sony lançou o Filtr Game. No jogo, é preciso cumprir missões para ganhar moedas que podiam ser trocadas por prêmios — de pins a ida de ônibus exclusivo ao Rock in Rio até vouchers que poderiam ser trocados por cervejas no evento. Em dois meses, foram cerca de 50 mil usuários. 

Músicas escolhidas por alguns desses usuários do game tocavam, nos intervalos dos shows do Rock in Rio, numa espécie de jukebox no palco do Filtr Live, por onde passaram atrações como Lagum, Selvagens à Procura de Lei, Mariana Nolasco e Armored Dawn.Enquanto a canção vibrava nas caixas de som, a foto do usuário era exibida no telão. 

“MERCHANDISE, AMOR”: O APP DA AMERICANAS NO CLIPE DE WHADI GAMA

O terceiro pilar do business development é “Product placement”. Em bom português, inserção de marcas em videoclipes — ou seja, o velho merchandise, ou “merchã”, que o povo mais do que se acostumou a ver nas novelas.

“É algo que atrai as marcas porque é eterno. Sempre que alguém assistir o clipe vai ver a marca”

Aconteceu em 2019 com o clipe de “Piscininha Amor”, de Whadi Gama, que virou hit. Assim que o cantor assinou com a Sony Music, a gravadora viu a oportunidade de trazer alguma marca para o clipe — e acionou a Americanas.com.

Logo no começo do filme, Whadi aparece comprando uma piscina pelo app da  Americanas e convidando a namorada para passarem o dia. Com participação de Gretchen e dos influenciadores e humoristas João Quirino e Isadora Nogueira, o clipe já tem mais de 30 milhões de visualizações no Youtube.

UMA LOJA ONLINE PARA VENDER ROUPAS E ACESSÓRIOS DE ARTISTAS

Há 18 anos na Sony Music, Lannes ingressou como controller do departamento financeiro e foi galgando novos cargos ao longo da carreira. VP de Business Development desde 2016, ele acredita que o departamento está consolidado — mas o desafio de inovar segue constante:

“Nos últimos três anos trabalhamos com um nível de aposta alto, em tentativas, e aprendemos fazendo. Conseguimos fazer, mas não foi rápido, foi uma construção. Tínhamos como ativo o relacionamento com os artistas e o mercado e aprendemos a usar isso de outra forma”

Uma das próximas apostas é a Fan Stage Store, uma loja online para vender roupas e acessórios no estilo usado por artistas. A loja já está no ar, mas por enquanto tem apenas a BFF Girls. Em breve, diz Lannes, entrarão produtos vinculados a outros músicos, como Yasmin Santos, Natiruts e a dupla Fernando & Sorocaba.

A ÁREA DE BUSINESS DEVELOPMENT HOJE RESPONDE POR 10% DO LUCRO

Com dez pessoas na equipe, a área de BD recorre frequentemente a outros times da Sony Music para cocriar as inovações. Foi o caso do Filtr Live, em que gente de outras áreas foi convocada para discutir como gerar valor para a plataforma. 

“Eu diria que os projetos mais fortes surgiram quando outras áreas se envolveram. A criação acontece dentro [da área] de BD, mas fazemos brainstorming com grupos da empresa toda”

Para fazer o line up de um evento, uma área específica da Sony Music identifica talentos e cuida de repertório. “Eles entendem mais do que ninguém de line up, então ajudam BD na curadoria, inclusive utilizando dados de business intelligence.”

Lannes não abre números, mas diz que a área de BD dobra seu faturamento a cada ano e hoje representa 10% do lucro da Sony Music no Brasil. 

Além de criar novas frentes de negócio e receita, a missão da área é ampliar os serviços oferecidos aos artistas. “Temos que continuar fazendo o gerenciamento de carreira e a distribuição das músicas, mas ir além. Olhamos para o artista e pensamos o que ele quer de serviço adicional.”

 

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