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A Hisnëk vendia snacks por assinatura. Agora, é uma healthtech que promove a saúde mental no escritório

Adriana Fonseca / 21 abr 2020
Carolina Dassie, CEO da Hisnëk (foto: divulgação).
Adriana Fonseca - 21 abr 2020
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(Reportagem publicada originalmente em outubro de 2019.)

 

Usado de forma exaustiva no universo das startups, o termo “pivotar” — dar uma guinada radical no rumo do negócio — se aplica perfeitamente ao caso da Hisnëk e de sua fundadora, Carolina Dassie, 35.

Economista de formação, com carreira até então no mercado financeiro, Carolina criou a startup em 2014 com a proposta de vender assinaturas de caixas com snacks sem aditivos nem gordura trans, com pouco sódio e açúcar. Era um negócio B2C puro, focado no consumidor final, mas o boca a boca cresceu e a empreendedora começou a ser procurada por empresas a fim de obter descontos para seus funcionários.

Nesse contato com o pessoal de Recursos Humanos, Carolina (economista de formação) descobriu uma grande dor das organizações: o gasto elevado com planos de saúde. Carolina afirma:

“Em algumas empresas, o custo com plano chega a aumentar 30% de um ano para outro — porque a população está doente, indo mais ao pronto-socorro. Quando fui a fundo, percebi que grande parte da sinistralidade vem em função de saúde mental”

Hoje, segundo dados da Previdência, transtornos como estresse, ansiedade e depressão já são a terceira causa de afastamento do trabalho por adoecimento no Brasil. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, alguns dos principais fatores de risco são assédio e bullying, excesso de trabalho, jornadas inflexíveis e a ameaça de desemprego.

A METAMORFOSE TECNOLÓGICA FOI MAIS FÁCIL POR ESTAR BASEADA NO CUBO

Além do aumento da sinistralidade, afastamentos por transtornos ligados à saúde mental são mais longos do que os de outra natureza e duram, em média, de seis meses a um ano.

A Ivi funciona por meio de um app. Basta instalar no celular.

“Vi que a saudabilidade das pessoas ia além da alimentação. Era preciso pensar na saúde mental também. E percebi que o RH tinha necessidade de uma empresa terceira ajudando nessa questão.”

A partir desse insight, Carolina deu início à metamorfose do seu antigo serviço de snacks por assinatura em uma healthtech. O caminho foi criar um robô baseado em inteligência artificial que pudesse entender como os funcionários das empresas estão se sentindo.

Para desenvolver a tecnologia, ela pediu ajuda a quem sentava, literalmente, na mesa ao lado — desde dezembro de 2018, a Hisnëk está baseada no Cubo, o hub de empreendedorismo mantido pelo Itaú e o fundo Redpoint eventures em São Paulo.

“Só conseguimos ser tão ágeis em uma mudança tão grande, de uma startup de saúde sem tecnologia para uma startup de saúde com tecnologia, porque estávamos em um ambiente que ‘respira’ tecnologia”

Batizado de Ivi (Inteligência Virtual da Hisnëk), o robô foi desenvolvido pela VideoBot, startup vizinha no Cubo, a um investimento de R$ 50 mil. Em paralelo, Carolina contratou um CTO. Hoje, além dele, a startup tem dois funcionários focados em desenvolvimento, numa equipe total de nove pessoas (antes de pivotar, eram apenas três).

POR MEIO DE UM APP, OS USUÁRIOS REPORTAM O SEU ESTADO EMOCIONAL

O foco da Hisnëk dentro das empresas são os trabalhadores aparentemente saudáveis. Hoje, diz Carolina, “o RH tem dados dos crônicos, diabéticos e hipertensos, mas não tem dados de quem está saudável — e de quem está a ponto de adoecer.”

Com base em três pilares (saúde mental, atividade física e nutrição), a Ivi funciona por meio de um aplicativo que os funcionários das empresas instalam em seus smartphones. Sempre que alguém acessa o app, responde a três perguntas: Como está sua emoção hoje? Qual é a intensidade dessa emoção? Por que está se sentindo assim?

A partir das respostas, a Ivi entende como o funcionário está se sentindo e indica conteúdos e práticas, como meditação guiada, exercício de mindfulness ou de respiração. O objetivo é ajudar o usuário a “despressurizar” e manter seu estado mental em um patamar saudável:

“A pessoa não vai ficar superzen, mas passa a entender que existem ferramentas para controlar o seu nível de estresse”

O conteúdo está disponível em vídeo, áudio ou texto. O usuário avalia cada material com “estrelas”, o que ajuda a plataforma a identificar o seu perfil. Graças à inteligência artificial, as indicações vão se tornando mais assertivas com o tempo de uso. “Se uma pessoa sempre avalia bem os vídeos e mal os textos, então o robô vai oferecendo mais vídeos.”

O ROBÔ TAMBÉM INCENTIVA A ATIVIDADE FÍSICA E DÁ DICAS DE NUTRIÇÃO

Para apoiar o bem-estar emocional dos funcionários, a Ivi também sugere atividade física e dá dicas de nutrição. Por meio de perguntas, o robô entende se a pessoa é sedentária ou se já pratica atividade física e, nesse caso, com qual intensidade, e apresenta planilhas de treino desenvolvidas por Camila Hirsch, educadora física parceira da Hisnëk.

“Fazer atividade física ajuda a manter a saúde mental. O colaborador recebe sua planilha de treinamento e tem um canal para tirar dúvidas e pedir adaptações no treino. Nosso objetivo é movimentar quem ainda não tem uma rotina de academia”

No pilar nutricional, a Ivi fornece conteúdos mostrando como o tipo de alimento ingerido pode influenciar no bem-estar. “Não é um viés estético, e sim de saudabilidade”, diz Carolina.

As caixas da Hisnëk custam cerca de R$ 80.

Os snacks ainda são vendidos no B2C (a cerca de R$ 80, a caixa com 22 itens), mas agora também fazem parte desse “pacote” maior e são oferecidos com desconto (por R$ 66,67) aos funcionários das empresas-clientes. “Queremos quebrar a barreira de preço para uma alimentação mais saudável.”

Por WhatsApp ou e-mail, é possível tirar dúvidas sobre alimentação e rotina com a nutricionista que faz parte da equipe da Hisnëk. “É apenas uma orientação, porque o Conselho [de Nutrição] não permite consultas a distância.” Com as informações captadas, a Ivi cruza as respostas de como a pessoa está se sentindo emocionalmente e faz recomendações alimentares (correlacionando, por exemplo, açúcar e ansiedade).

AS INFORMAÇÕES GERAM RELATÓRIOS QUE PERMITEM AÇÕES PREVENTIVAS

Com a solução pronta, a Hisnëk começou a oferecer o robô em maio de 2019. As informações captadas geram relatórios que permitem às empresas observar se há algum ponto crítico que precise de atenção:

“Mostramos onde é mais urgente fazer uma ação focada. Se várias pessoas do departamento financeiro apresentam um nível elevado de estresse, é um ponto de alerta. As pessoas podem estar a ponto de ter Burnout, então o RH pode usar o dinheiro para prevenção com foco”

A incorporação da tecnologia está sendo feita cliente a cliente, com as customizações necessárias – hoje são dez, incluindo Nokia, Dasa, Alelo, Pirelli e Glassdoor (ex-Love Mondays). A expectativa de Carolina é encerrar o ano com algo entre 20 e 30 empresas na carteira.

O preço do serviço varia com o tamanho do cliente. Uma companhia de mil funcionários paga cerca de R$ 2 200 mensais pelo uso da Ivi. “O RH é uma área que tem orçamento controlado, então pensamos em um produto que ‘coubesse’.”

No meio de sua terceira rodada de investimentos, Carolina não pode abrir, neste momento, o faturamento da empresa, mas diz que em função do novo produto espera triplicar, neste ano, em relação a 2018.

A NOVA EMPREITADA É UM APLICATIVO PARA PACIENTES COM CÂNCER

Em junho de 2019, a Hisnëk foi selecionada pelo Acelera SAB, programa de aceleração do Instituto SAB, mantido pela Sociedade Assistencial Bandeirantes, com três meses de duração, mentorias e suporte financeiro para rodar um projeto piloto: o uso da tecnologia em um novo aplicativo para apoiar o tratamento de cerca de 10 mil pacientes oncológicos do Hemocentro São Lucas.

Carolina explica que a motivação por trás desta empreitada específica é bastante pessoal:

“Eu perdi o meu pai muito nova por causa de um câncer. Quando vi a chamada [do programa], pensei nesse projeto. Adaptamos os conteúdos e vamos rodar a Ivi para o paciente se sentir o melhor possível durante a quimioterapia”

A empreendedora teve apoio de médicos do Hemocentro para reformular as perguntas, os conteúdos e a tecnologia da Ivi. O aplicativo começará a ser usado ainda em outubro, e as informações inseridas pelos pacientes vão abastecer automaticamente os seus prontuários, ajudando a equipe médica a conhecer melhor os efeitos pós-quimioterapia.

“Às vezes, o paciente esquece de reportar algum efeito colateral, e isso é importante para o médico ajustar a quantidade da medicação.”

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