Empresas que têm mais sucesso em se adaptar às mudanças de mercado são aquelas em que a inovação está muito integrada à estratégia do negócio. Essa percepção tem levado profissionais das mais variadas formações a ganhar espaço dentro das companhias enquanto intraempreendedores – inovadores corporativos encarregados de hackear o sistema por dentro.
Richard Lee, 30 anos, é um desses intraempreendedores. Um ano após se formar na FGV, deixou o Direito de vez para embarcar no programa de trainees da Ambev. Ao longo dos anos seguintes, foi crescendo dentro da empresa, onde hoje atua como gerente de sustentabilidade.
Entrevistado para o Sebraecast, Richard falou sobre inovação corporativa e a criação de um projeto disruptivo inédito: a água Ama, lançada pela Ambev em março de 2017. O negócio social reverte 100% do seu lucro para projetos que levam acesso à água ao semiárido do Brasil.
“Trinta e cinco milhões de brasileiros não têm acesso a água potável. É um número que eu não conhecia”, diz Richard. “Até esse projeto, eu tinha skills [habilidades] muito mais técnicas e ligadas a negócios. Abri os meus olhos para outra realidade.”
A velocidade (apenas seis meses) com que a Ama saiu do papel e ganhou as prateleiras comprova o quanto a ideia engajou outras pessoas na Ambev – um engajamento que enche Richard de orgulho. Entre março e dezembro de 2017, o negócio gerou R$ 1,6 milhão de lucro, permitindo a realização de projetos em nove comunidades do Ceará e Piauí, que juntos garantem acesso a água potável para 6.600 pessoas.
Investir em negócios paralelos que aproveitam a estrutura fabril e as redes de distribuidores e fornecedores é um caminho para deixar um legado social. O projeto, porém, precisa se sustentar sozinho. A receita da Ama banca insumos, custos operacionais, despesas de marketing – e ainda sobra o lucro.
A Ama contribui ainda para a retenção e atração de talentos pela Ambev: mais da metade dos trainees contratados em novembro de 2017 indiciou a marca como uma de suas preferidas no portfólio da empresa.
Mesmo assim, Richard conta que, se pudesse voltar no tempo e retrabalhar algum aspecto do projeto, esse seria a comunicação. Não chega, porém, a ser um arrependimento. E, provocado pelo entrevistador a refletir se estaria disposto a empreender com o próprio dinheiro, afirmou:
“Curto demais o que faço, aprendo muito. Hoje não tenho nenhuma ideia que ache vencedora para perseguir sozinho ou paralelamente. Mas estar na Ambev e ser exposto a novas ideias e modelos vai me fortalecer muito, caso eu queira empreender.”
A experiência deu a ele uma visão bastante apurada sobre as características exigidas de um inovador corporativo. Richard lista pontos que precisam estar no manual de todo intraempreendedor. Primeiro: não seja individualista, nem se deixe guiar demais pelo ego.
“Inovação não se faz sozinho. Você até pode ter a primeira ideia sozinho – mas não tem sucesso e não faz nada acontecer sem o envolvimento de mais pessoas da organização.”
Segundo ponto: ter cabeça aberta, estar sempre à procura de cases externos, novas referências e tendências. Isso ajuda muito a chegar a uma ideia vencedora – mas, para Richard, não é suficiente. São necessárias ainda perseverança e resistência a frustrações. Após trabalhar e amadurecer a ideia com cuidado, deve-se estar preparado para objeções ou provocações.
“Não se pode ficar frustrado de ter de voltar para a prancheta e redesenhar. Várias boas ideias e inovações deixam de existir muito antes de encontrarem qualquer resistência da própria organização. Morrem na prancheta.”
Um terceiro ponto é entender bem a organização em que você está inserido:
“Antes de trazer mil ideias, faça uma pesquisa. Sem essa percepção, talvez o pessoal tenha menos sucesso e acabe se frustrando. Não é preciso passar anos dentro da organização para entendê-la, mas segure um pouco a ansiedade.”
A inovação corporativa pode e deve ser cada vez mais cultivada. Mas e quanto ao dono de uma startup igualmente inovadora, que queria emplacar um projeto junto a uma grande empresa, como a Ambev? Qual seria o ponto de partida para um pitch perfeito? Richard dá a dica:
“Vá com uma ideia simples, bem formatada, e direto ao ponto. Não se preocupe tanto com a apresentação em si. O que precisa estar muito claro é o que você está oferecendo, como isso pode ser benéfico para o meu business – e o que você busca em troca.”
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O Sebraecast apresenta uma série de entrevistas com empreendedores sobre startups, negócios criativos, negócios sociais, inovação corporativa e lifehacking. Confira a websérie em youtube.com/sebrae e o podcast em soundcloud.com/sebrae!