Aceitar que alguns ciclos encerram exige coragem. Ainda bem que coragem é algo que parece não faltar a Jules de Faria.
A paulistana já deu voz, rosto e anos de dedicação à Think Olga, organização feminista que visa combater o sexismo e a desigualdade de gênero e promover o empoderamento das mulheres.
Recentemente, ela se viu pronta para uma nova etapa profissional, quase como uma “carreira solo”. Dessa ânsia nasceu o Estúdio Jules, que oferece consultoria de branding e posicionamento de marca.
Com o Estúdio, Jules pretende fornecer a indivíduos e organizações as ferramentas e o conhecimento para criar mudanças positivas em suas respectivas esferas.
Nas palavras de Jules, a intenção é “dar contornos à história dos clientes e cuidar do lugar deles no mundo a partir da compreensão de propósito, definição de identidade e criação de posicionamento, sendo guardiões do legado, comunicando-o da maneira mais cuidadosa, eficiente e eficaz possível”.
A descrição que Jules faz da nova empreitada é acompanhada por um encantamento, um brilho no olhar próprio de quem trabalha com o que acredita. Mas isso não significa que a jornada até aqui tenha sido fácil.
Se desprender da liderança da Think Olga e da Think Eva – esta última lançada em 2015 como uma consultoria de business intelligence sobre o universo feminino – foi uma ruptura difícil, ocasionada por um trauma pessoal. No final de 2020, Jules sofreu uma perda gestacional. Ela conta:
“Fui muito atravessada por um pilar dessas conversas sobre feminilidade que eu tinha todos os dias no trabalho, que é a maternidade. Foi uma daquelas rasteiras da vida que fazem a gente repensar, e consequentemente um momento de ressignificação de carreira”
Nesse movimento, Jules olhou para a sua trajetória e se abriu para descobrir qual era o fio condutor de tudo o que ela havia feito até então, para dar forma a um novo projeto. A experiência foi tão eficaz que ela decidiu passar adiante as suas descobertas. Na forma de um novo negócio.
A primeira cliente do Estúdio Jules – quando a nova empresa ainda nem tinha esse nome – foi Ana Julia Kiss, fundadora e CEO da Humora, a primeira marca de bem-estar com microdoses de cannabis do Brasil.
O desafio era construir uma marca consciente, em meio a um contexto histórico de repressão e criminalidade, que tivesse os seguintes valores: bom humor, leveza e otimismo.
“Eu, com a minha formação corporativa, mesmo criticando tudo o que acontece no mundo canábico, ainda caía no ‘mais do mesmo’ quando pensava em posicionamento de marca…”, diz Ana Julia.
Ela conta como o trabalho com Jules foi surpreendente e ajudou a dar um chacoalhão nessas ideias pré-concebidas. E assim surgiram o novo posicionamento e a estratégia de marca da Humora:
“Com o Estúdio Jules a gente entendeu que o nosso core não era só vender cannabis, que a gente tinha algo autoral – e que o bom humor seria a luz guia. O trabalho foi uma experiência de zelo, que deixa um legado de estratégia sim, mas de cuidado com a humanidade, também”
Jules descreve esse processo com a Humora como “um chamado” que ela recebeu. Uma oportunidade de se tornar guardiã de uma marca com propósito, para além de uma consultoria criativa tradicional.
E a partir daí seguiram outros trabalhos que começaram a dar forma ao Estúdio Jules enquanto empresa.
Com o Instituto Ecofuturo, organização focada na conservação da natureza e proteção da biodiversidade da Suzano, Jules também fez um entendimento de propósito, mas dessa vez com um cliente de muito legado.
Após 20 anos de atuação, o instituto desejava reencontrar seu cerne, firmar um propósito categórico e comunicar de maneira simples, mas convicta a sua razão de existir.
O resultado foi um trabalho de resgate de memória, uma narrativa modernizada do histórico do instituto, a definição de brand story guide e direcionamentos táticos de comunicação interna e externa.
Um trabalho semelhante também foi feito com o Instituto Avon, que recorreu ao Estúdio Jules para celebrar seus 20 anos identificando e materializando iniciativas e projetos focados no bem-estar e na saúde física e psicológica da mulher (em entrevista ao Draft, a diretora-executiva Daniela Grelin contou como o instituto mobiliza empresas para encarar a violência contra mulheres e meninas).
Já com a Think Twice, organização fundada em 2013 com o propósito de promover a Educação em Direitos Humanos, Cultura de Paz e Engajamento Cívico como ferramenta de transformação da sociedade, o trabalho do Estúdio Jules foi principalmente sintetizar a comunicação.
“A experiência com a Ju foi muito profunda”, diz Gabriele Garcia, cofundadora da organização. “Ela foi capaz de entender meus desafios e mergulhar na nossa trajetória. Ela tem essa capacidade de enxergar valor em pessoas e empresas de vanguarda, tira a gente da zona de conforto, e tem uma escuta muito ativa. O trabalho dela ilumina o nosso caminho.”
Jules entende essa relação com as marcas como algo que vai muito além de uma consultoria:
“O meu papel é fazer quase uma terapia – uma ‘brand therapy’ – com essas pessoas que estão tocando seus negócios. A gente aborda, em encontros recorrentes, assuntos mais práticos, mas também entende de forma mais sensível como manter o propósito vivo e evidente”
Isso exige, como é de se esperar, uma abertura da parte do cliente para fazer uma imersão na sua própria história, para resgatar o que permeia todas as suas iniciativas, projetos e produtos – além de disposição para abandonar o que já não faz sentido e construir novas narrativas.
Jules diz que desde a fundação do Think Eva, em 2015, mais empresas vêm se preparando para fazer essa auto análise e tocar em assuntos por vezes incômodos, para se conectar não só com causas específicas, mas colocar em palavras e ações a sua razão de existir.
“As causas são coisas bem maiores, coletivas e sociais, que a gente divide. Concorrentes podem dividir causas, por exemplo. Mas o propósito é o porquê de estarmos nesse espaço no mundo”
Essa “terapia” proposta por seu Estúdio é algo que ela própria já experimentou – e continua experimentando. Jules conta que os anos de Think Olga e Think Eva fizeram dela “a pessoa das mulheres”. Jules, porém, queria ir além.
“Claro que as questões de gênero sempre vão estar alinhadas com o que faço. Mas eu queria criar novos mundos.”
A força criativa para dar vida a ideias ambiciosas sempre permeou sua história, desde a formação em moda até a criação do próprio Estúdio, mas agora Jules quer focar em dar suporte e ferramentas para outros visionários e visionárias.
“Quando se tem uma ideia visionária, que quer impactar as pessoas ao seu redor, isso pode estar muito claro para você, mas é um processo solitário. Não adianta enxergar um novo mundo e ninguém conseguir habitá-lo”
Acima de tudo, o Estúdio Jules é um testemunho da paixão de Jules por ideias movidas por propósito.
“O processo corporativo está sempre na frente do imaginar, do sonhar – mas a gente precisa disso. E eu me sinto na obrigação de proteger os sonhadores e as sonhadoras.”
O Brasil é um país de leitores? Tainã Bispo acredita que sim. Ela migrou de carreira, criou duas editoras independentes (a Claraboia, que só publica mulheres, e a Paraquedas), um selo editorial e um serviço de apoio a escritores iniciantes.
Apenas 3% das maiores empresas do Brasil são comandadas por mulheres. Para entender como reverter esse quadro, fomos atrás de projetos que trabalham para catapultar a presença feminina na alta liderança.
O período da menstruação ainda é motivo de desconforto para muitas mulheres. Marca de discos e coletores menstruais, a femtech Yuper aposta também na comunicação para estimular o autocuidado feminino e desfazer tabus.