No início dos anos 90, um movimento de contracultura surgido na cidade de Recife (PE) começou a questionar o abandono econômico-social e a desigualdade. O manguebeat misturava ritmos, como as batidas do maracatu com o rock, e gerou verdadeiras ondas de impacto, que abalaram a sociedade pernambucana e repercutiram também fora do estado. Foi nesse contexto que, no coração da capital pernambucana, nasceu o CESAR.
Desde então, e hoje dentro do Porto Digital e de um centro histórico renovado e cheio de vida, o CESAR vem construindo uma trajetória de transformação pela inovação, ancorada em educação, negócios, tecnologia e design. Mas essa história, que completa 25 anos neste dia 14 de maio de 2021, não teve início ali, e sim nos corredores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Em 1993, um grupo de professores do Centro de Informática começou a debater a relação entre universidade e sociedade.
“Era um debate que combinava política, filosofia e a própria noção de Academia. A gente se perguntava o que era a universidade e o que estávamos fazendo ali: para quem, por quê, com quem”, explica o cientista e empreendedor paraibano Silvio Meira, professor emérito da UFPE e um dos fundadores do CESAR.
Era uma discussão muito ligada à evasão de talentos que se observava em Recife. Fred Arruda, atual CEO do CESAR, lembra de um episódio marcante:
“Praticamente uma turma inteira de formandos em Computação da UFPE foi contratada para trabalhar em uma empresa de São Paulo. Começamos a ficar inquietos com isso e a discutir um instrumento que pudesse reter a mão-de-obra qualificada em Recife”.
A solução foi criar um centro de inovação privado, sem fins lucrativos e autossustentável.
“Era fundamental entender a dificuldade de empreender. A Academia normalmente é muito isolada e autossuficiente, e um centro de inovação que faz a ponte entre Academia e mercado tinha que ser extremamente aberto e predisposto a trabalhar em rede. Esse era o espírito”, diz Silvio.
Foi com esta missão que, no dia 14 de maio de 1996, nasceu o CESAR.
Naquela época, Ana Carolina Salgado era professora da UFPE e assinou o ato de fundação do CESAR, junto dos três fundadores: Silvio, Fábio Silva e Ismar Kaufman. Desde 2017, ela é diretora acadêmica do Centro e participou da criação da CESAR School.
“A educação fazia parte do CESAR desde a fundação. Mas em 2006 isso se consolidou de outra forma, quando o Silvio sugeriu a criação de um mestrado profissional”, conta.
Ana Carolina explica que a atuação do CESAR em processos de formação tem duas vertentes: projetos educacionais em escolas de ensino fundamental e médio e ensino superior. O primeiro curso formal do CESAR foi o mestrado profissional em Engenharia de Software. Hoje, a escola conta com cursos de graduação, mestrado e doutorado profissional. Em 2020, chegou à marca dos 250 mestres formados.
“Em dezembro de 2021 vamos formar as primeiras turmas de Computação e Design. E são alunos que trabalham desenvolvendo projetos desde o começo do curso, que têm contato com os clientes, com as empresas do Porto Digital”, diz Ana.
A interseção entre educação, negócios e tecnologia sempre foi forte no CESAR.
“Lá na década de 90, os nossos alunos na UFPE estavam com uma formação diferenciada e as empresas locais não eram adequadas; eles estavam migrando para outras regiões. Então o CESAR foi criado na perspectiva de mudar o trabalho local, de operar como uma incubadora”, conta.
Neste vídeo, Silvio Meira, o designer H.D. Mabuse e a diretora-executiva Roberta Fernandes contam a história da fundação do CESAR e falam da missão do centro. Vale assistir!
Logo no início, o Centro incubou pelo menos quatro empresas. Algumas das diversas startups que o CESAR ajudou a criar ao longo desses 25 anos foram a Tempest e a Neurotech, em 2002, a E-capture e a Pitang, em 2004, e a Fusion, em 2014. O CESAR certamente foi alicerce para o cenário que precisa ser pintado quando se pensa em um dos maiores parques tecnológicos do país – e também de uma economia e de uma cultura pulsante, que hoje irradia para além de Pernambuco.
Cláudio Marinho, CEO da Porto Marinho e membro do conselho do CESAR, esteve diretamente envolvido na criação do Porto Digital, em 2000. Ele conta que o Centro foi a primeira instituição que migrou para o complexo.
“A gente adquiriu prédios antigos e destinou ao CESAR. O da Praça Tiradentes foi o primeiro deles e, a partir daí, aquela região ganhou vida nova”, lembra.
Para Cláudio, a participação ativa e intensa dos professores que fundaram o CESAR foi fundamental para a criação do Porto Digital:
“São milhares de horas de dedicação de empreendedores cívicos que se comprometeram com o desenvolvimento de uma região. À medida que o Centro evoluía, ele criava empresas e crescia dentro do sistema do Porto Digital. E na visibilidade que começou a ter, levava consigo o Porto, e vice-versa. O CESAR é uma das âncoras do Porto Digital, sempre foi”.
Desde o início, para incubar as empresas, o CESAR precisava de recursos, que vieram do desenvolvimento de projetos de tecnologia para empresas locais e nacionais.
“Então muitos professores eram consultores dos projetos. Essa também era uma motivação: desenvolver pesquisa relevante para a sociedade”, diz Ana Carolina.
Logo vieram parcerias de peso, como IBM e Motorola, que faziam parte do conselho do Centro, e outras incentivadas pela Lei de Informática, como o Itautec. O Centro era referência nas linguagens de programação que despontavam naquele momento. Fred conta que os dois maiores projetos em Java do Brasil foram desenvolvidos pelo CESAR, para o DataSUS e o Ministério de Ciência e Tecnologia.
“Qualquer empresa vive de negócios. E a gente desenvolveu uma estrutura para ir ao mercado com o seguinte posicionamento: pessoas impulsionando a inovação e inovação impulsionando negócios”, diz Fred.
Para o CEO do CESAR, isso significa que é necessário estar atento às mudanças do mercado, mas também ser provocador sobre essas mudanças.
“Como centro de inovação, devemos nos obrigar a introduzir novas formas de pensar nossa agenda do futuro. E aí a gente começa a pensar também em criação, que tem tudo a ver com design”, explica Fred.
Para ele, não tem como fazer inovação sem olhar para o usuário: de forma colaborativa e em termos de experiência.
“A inovação não é mais orientada a tarefas, mas ao cliente. E hoje o CESAR é uma organização design driven”, completa.
O design sempre existiu dentro do CESAR e se tornou um de seus alicerces já nos primeiros anos, com a entrada de H.D. Mabuse para a equipe. Hoje, dos quase mil colaboradores do Centro espalhados pelo Brasil e pelo mundo, cem são designers. Eles atuam de forma articulada e distribuída, em todas as áreas do CESAR.
“Vivemos um momento em que existe essa preocupação com negócios, com um viés de inovação tecnológica, mas também com algo que surge a partir dos anos 2005, que é uma ênfase no entendimento das pessoas por meio do Design”, diz Mabuse.
Para o consultor do Centro, esse olhar, cada vez mais, se consolida no que ele chama de questões do cuidado.
“Não só o cuidado com as pessoas dentro de casa, dentro do CESAR, mas o cuidado com o que a gente produz para fora, o que a gente faz com as outras pessoas”, reflete.
Para ele, esse viés é cada vez mais determinante na atuação do CESAR e de outras instituições.
Cláudio Marinho lembra que o CESAR é uma instituição com nome de gente, o que já evidencia a valorização das pessoas.
“No início, a preocupação era com a transferência de conhecimento entre a sociedade e a academia. Sempre quisemos tratar de problemas relevantes da sociedade e hoje queremos formar pessoas transformadoras da realidade”, diz.
Para Fred Arruda, além dos valores e princípios do CESAR, o compromisso em subir a régua de inovação e produtividade no Brasil é uma constante na trajetória do Centro, e mantém acesa a chama que vem lá dos primeiros debates sobre a criação da instituição. O CESAR já vem construindo uma história de projeção nacional e internacional: está presente em Manaus, Curitiba, Sorocaba, São Paulo e Rio de Janeiro e tem clientes de outros países também.
“A gente surgiu com o compromisso de fazer o Brasil ser mais relevante no uso de tecnologia. Queríamos estar no mindset global como país que promove inovação e empreendedorismo nos seus ecossistemas. Hoje, a gente atua intensamente em alguns deles. E esse compromisso continua muito vivo”, conclui Fred.
Veja os principais marcos da história do CESAR nesses 25 anos:
*Todas as fotos deste post foram produzidas antes da pandemia de Covid-19.